Análise do Acordo de Paris: o que o texto preliminar pode nos dizer?

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Às 15:00 de ontem (9/12/2015), uma nova versão draft do Tratado de Paris foi liberada pela UNFCCC (o texto pode ser acessado aqui). O documento possui 29 páginas, mas ainda esta recheado com opções de redação e muitos parênteses. Existe algum alento uma vez que o documento anterior possuía 48 páginas. Não obstante, questões fundamentais permanecem em aberto. Por isso, procuramos fazer uma Análise do Acordo de Paris, buscando pistas do que será definido pelos países membros da ONU nos próximos dias.

Para quem não está familiarizado com o processo de negociação, opções de redação são adicionadas quando uma parte do acordo (um país) prefere sugerir uma alternativa ao texto. Opções textuais relevantes podem ser identificadas nos parágrafos que estabelecem a ambição do acordo, as metas coletivas de longo prazo, a diferenciação entre países e o financiamento.

Já os parênteses são adicionados quando uma parte não concorda com parte de um parágrafo, ou com o parágrafo inteiro. Segundo contabilização da parisagreement.org, o texto atual reduziu o número de parênteses de 916 para 366, indicando, portanto, algum avanço.

Diferenciação, financiamento e ambições

Questões relacionadas a diferenciação, financiamento e ambições do acordo permanecem abertas. Se por um lado o texto atual apresenta opções de redação bem mais claras para estes itens, estas seções continuam inundadas de parênteses. Sem dúvidas, são estes os pontos de maior debate e que devem ser o centro das negociações até sexta feira.

As ambições do acordo buscam limitar o aquecimento global em 2ºC. As opções de texto estabelecem compromissos para (Parágrafo 1, Artigo 2) «Manter o aquecimento da temperatura média global …»

  • Opção 1: abaixo de 2ºC (below 2ºC)
  • Opção 2: bem abaixo de 2ºC (well below 2ºC)
  • Opção 3: abaixo de 1,5ºC (below 1,5ºC)

Por sua vez, no Artigo 3, que trata das metas coletivas de longo prazo, o termo «net zero greenhouse gas emission» retornou ao texto. O termo fundamenta-se em avaliações científicas que estabelecem nosso orçamento de carbono, indicando que um trajeto para emissões zero é importante se quisermos manter o aquecimento global em 2ºC. As metas atuais implicam em um aquecimento de 2,7ºC, sinalizando que emissões zero precisariam ser atingidas entre 2060 e 2070 para mantermos a meta dos 2ºC.

O termo é importante porque daria ao Acordo de Paris a credibilidade para manter, dentro de um prazo factível,  o aquecimento médio global em 2ºC . Portanto, o estabelecimento de uma meta coletiva de longo prazo permite que o acordo estabeleça um mecanismo que aumente a ambição dos países ao longo do tempo, criando gatilhos para progressos nos esforços de mitigação das emissões de GEE. Outro ponto fundamental do acordo é a periodicidade para avaliação e acionamento destes gatilhos. No momento, o chamado Global Stocktake, que informará o avanço dos esforços de mitigação, deverá acontecer pela primeira vez em 2024. Parte da negociação busca antecipar esta primeira rodada de avaliação para 2018 ou 2019.

Por fim, outro item crucial do acordo trata do fornecimento de financiamento para apoiar países pobres a responder às ameaças das mudanças do clima. Neste sentido o debate acerca da diferenciação entre países é central. Países em desenvolvimento buscam refletir no texto que não irão fornecer financiamento. Uma proposta norte americana buscou introduzir a visão de que «países capazes de fazê-lo» também devem fornecer financiamento, claramente sinalizando uma intenção de trazer para a barca países dos BRICS e do leste europeu. Contudo, o termo parece estar perdendo força na última versão do acordo.

É relevante contudo notar que a nova linguagem introduz um esforço voluntário de países em desenvolvimento para o financiamento climático. O texto afirma que «países em desenvolvimento, de maneira voluntária, podem fornecer fundos para complementar o suporte de países desenvolvidos» (Artigo 6). Por fim, o volume de financiamento continua em aberto. A promessa atual de recursos para o financiamento climático é de USD 100 bilhões. Os países em desenvolvimento gostariam de ver este valor como um piso e não como um teto, com o financiamento após 2020 crescendo na medida que o acordo de Paris entre em vigor.

Cresce o coro para que estes temas sejam logo escalados para o nível ministerial, permitindo que os principais impasses sejam solucionados mais rapidamente. Ecoa pelos corredores do Le Bourget que nada esta acordado até que tudo esteja acordado. Assim, os ministros irão se reunir hoje as 20:00 e devem manter o diálogo durante a madrugada de hoje e o dia de amanhã (quinta feira). O prazo para a finalização do acordo é sexta feira. Possíveis avanços na reunião ministerial desta noite serão fundamentais para sinalizar se um acordo de fato poderá emergir no dia 11 de Dezembro.

Henrique Pereira
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Henrique é graduado em Relações Internacionais, Pós Graduado em Tecnologias Ambientais e Mestre em Desenvolvimento e Meio Ambiente. Co-fundador e CEO da WayCarbon, é um eterno otimista e acredita que as pessoas possuem todo o potencial de transformação e mudança que o mundo precisa. Vive o desafio de empreender e de compartilhar os valores da sustentabilidade. Mora na cidade, mas gosta mesmo é da roça: de comida no fogão a lenha, das cavalgadas pelo Rio Indaiá e dos casos que parecem mentira.

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