Introdução aos fatores ESG e o seu valor agregado à empresa
Conteúdo reproduzido, originalmente publicado no LinkedIn Pulse pela professora Viviane Torinelli.
Você sabe o que é ESG e como se deu sua evolução? Entende por que esse tema está tão em voga hoje e por que essa agenda deve ser implementada no mundo corporativo e financeiro?
ESG remete à sustentabilidade. É a incorporação de práticas de sustentabilidade ambiental, inclusão social e governança do universo corporativo e sua consequente transformação em um ativo tangível do ponto de vista financeiro, viabilizando um diferencial competitivo para as empresas.
ESG envolve a incorporação dos valores para a sociedade em uma nova forma de fazer negócios. Implica em riscos e oportunidades que demandam uma gestão integrada dos fatores ESG do nível estratégico ao operacional, com desafios e oportunidades para empresas de todos os setores da economia.
ESG entrega valor através de compromissos públicos e monitoráveis, como certificações, ODS e pactos setoriais, além de contribuir para a robustez na governança das empresas, com novas métricas, metas e impactos na remuneração de longo prazo. ESG contribui para o valor agregado das organizações, sistemas e negócios.
O acrônimo ESG
O termo ESG é o acrônimo de Environmental, Social and Governance e se refere aos fatores ambientais, sociais e à governança como suporte a um desenvolvimento sustentável. O ESG é uma abordagem de gestão de ativos em que os investidores reconhecem a relevância dos fatores ambientais, sociais e de governança (ESG, do acrônimo em inglês) em suas decisões na escolha de investimento, inclusive de empresas.
Os fatores ambientais incluem o uso e a interação com recursos renováveis e não renováveis, como exemplo a água, os minerais, os ecossistemas e a biodiversidade. Estão associados às mudanças climáticas, à discussão dos impactos da matriz energética, ao esgotamento de recursos, à poluição e geração de resíduos e ao desmatamento.
Os fatores sociais são os fatores que afetam a vida dos humanos. Incluem a gestão de recursos humanos, comunidades locais e clientes. Englobam temas como condições de trabalho, exploração infantil, diversidade na força de trabalho, inclusão social, interação com as comunidades locais, saúde e segurança das pessoas.
A governança contempla questões inerentes ao modelo de negócios ou às práticas comuns no setor, bem como o interesse das partes relacionadas (stakeholders). Inclui aspectos ligados a suborno e corrupção, e remuneração executiva, diversidade e estrutura do conselho, lobby e doações políticas, e estratégia tributária.
A evolução do ESG
Nos últimos anos, as questões ESG chegaram a um patamar mais estratégico nas empresas. Muitos setores com impactos ambientais significativos têm se comprometido com uma agenda de transição para uma economia de baixo carbono, mais inclusiva e com maior compromisso de transparência. Nesse movimento também está incluído o mercado financeiro, com compromissos firmados para financiamento desta transição.
Por muito tempo, a sustentabilidade foi considerada uma área a parte dentro da maioria das empresas. As decisões de negócios não consideravam os impactos negativos gerados pela atividade da empresa na sociedade e meio ambiente. No entanto, nos tempos atuais, por pressão de investidores, conselheiros, consumidores e fornecedores, as empresas estão sendo cobradas a considerar esses impactos na tomada de decisões estratégicas. Esse público possui interesses diversos, mas há convergência na percepção de que a perenidade de uma empresa não está ligada apenas à sua capacidade de gerar caixa e lucro, mas também está relacionada à sua responsabilidade de gerir e mitigar riscos e à sua capacidade de contribuir para criar impacto positivo nas frentes social e ambiental.
Nesse contexto, é reconhecida a dependência e impacto da cadeia produtiva na sociedade em que vivemos e no ecossistema como um todo. Destaca-se a interdependência entre a economia, as organizações, os indivíduos e o ambiente natural. Essa relação gera riscos e oportunidades a serem geridos e explorados.
Em uma gestão que contemple adequadamente os fatores ESG, o desenvolvimento de um conjunto de informações relevantes, e de dados confiáveis sobre os aspectos ESG da organização, aumenta a confiança de investidores, consumidores e demais stakeholders nas empresas e mercados, influenciando a alocação de recursos via sistema financeiro.
A importância de implementar o ESG hoje
No relatório do Fórum Econômico Mundial de 2021, as questões ambientais e sociais dominaram todos os cinco principais riscos de longo prazo, em termos de probabilidade, e quatro em termos de impacto. Os riscos ambientais estão aumentando e os riscos econômicos não estão mais no top 5. A figura 1 retrata a evolução dessa análise no âmbito desse fórum. Ela ilustra bem a relevância dos fatores ambientais e dá indicações de reflexos na lógica de risco e retorno dos ativos.
Figura 1- Evolução dos riscos de longo prazo, conforme Fórum Econômico Mundial
Conforme relatório de 2021 do Painel Climático Científico Mundial (IPCC), é inequívoco que a influência humana aqueceu a atmosfera, o oceano e a terra. Mudanças rápidas e generalizadas na atmosfera, oceano, criosfera e biosfera ocorreram. A mudança climática está se materializando com mais força e mais rapidamente do que muitos esperavam.
De acordo com análise realizada pela McKinsey (2020), a mudança climática já está causando impactos físicos substanciais em nível local e que tendem a crescer, se intensificar e se multiplicar. Além disso, de acordo com a ciência do clima, o aquecimento adicional continuará a aumentar a frequência e / ou gravidade dos perigos climáticos agudos em todo o mundo, incluindo ondas de calor letais, precipitação extrema e furacões. A previsão é também de intensificação dos riscos crônicos, como seca, estresse por calor, e o aumento do nível do mar. São previstos impactos socioeconômicos globais substanciais, especialmente para os países com menor PIB per capita. O relatório em questão destaca área de risco de seca para praticamente todo o Brasil em 2050, conforme demonstrado na figura 2.
Figura 2- Projeção McKinsey 2050.
No início do ano, o Instituto Meteorológico do Reino Unido (UK Met Office) e a Organização Meteorológica Mundial divulgaram uma pesquisa demonstrando que há mais de 40% de chance de que a temperatura global média anual em pelo menos um dos próximos cinco anos chegue temporariamente a 1,5 ° C acima dos níveis pré-industriais. Com o Acordo de Paris em 2015, a comunidade internacional concordou em manter o aumento da temperatura global neste século bem abaixo de 2,0 ° C acima dos níveis pré-industriais e em buscar esforços para limitar o aumento da temperatura a 1,5 ° C. O limite de 1,5 ° C é importante porque viabiliza os chamados “pontos de inflexão” – loops de retorno positivo, onde o aquecimento global causa uma mudança permanente nos sistemas terrestres, bloqueando o aquecimento posterior.
A questão climática, ambiental e seus reflexos sociais são amplos, severos e demandam uma ação global, regional e local, micro e macroeconômica, coordenada e urgente.
Impacto setorial da discussão ESG
A discussão dos aspectos ESG varia entre setores, em decorrência da atividade do negócio, da tecnologia aplicada, da pressão das partes relacionadas, das tendências do mercado consumidor, da visibilidade das questões enfrentadas e dos objetivos estratégicos de cada negócio.
O ESG deve estar na agenda de toda empresa, ainda que que com maior urgência nos setores que mais impactam ou são impactados. Para uma discussão dessa problemática por indústria, podemos ver na figura abaixo os setores que mais impactam negativamente o meio ambiente, e os setores mais impactados por essas mudanças:
Figura 3- Setores que mais impactam o meio ambiente e setores mais impactos
As mudanças climáticas estão se materializando mais rápido do que o previsto. Sendo assim, é importante reconhecer que os riscos socioeconômicos são ainda maiores em países de menor PIB per capita, como o Brasil. Ao reconhecer a importância de integrar ESG, empresas e investidores contribuem para a diminuição das consequências dos danos já causados ao planeta e contribuem para uma sociedade mais igualitária. Adicionalmente, o valuation dos negócios é também impactado pelos compromissos e práticas ESG.
ESG e as finanças
Os fatores ESG podem afetar o risco, a volatilidade e a rentabilidade das empresas e dos investimentos. É importante entender que as empresas podem ter papel positivo e negativo sobre a sociedade. Sendo assim, é indispensável que tanto as empresas quanto os investidores reconheçam a relevância de se incorporar os fatores ESG na tomada de decisão dentro das organizações, buscando externalidades socioambientais positivas de longo prazo.
É evidente, levando em consideração estudos realizados, que há uma relação positiva ou neutra entre ESG e desempenho financeiro. Outros estudos mostram também benefícios em outros aspectos como: correlação positiva entre eficiência da utilização dos recursos e retorno financeiro, assim como entre a satisfação dos funcionários e o retorno aos acionistas. Além disso, a abordagem dos fatores ESG dentro das empresas pode ser reconhecida como um fator positivo na competitividade a longo prazo frente a outras empresas do setor, atuando também na redução da externalidade negativa (de situações em que a produção ou consumo de bens e serviços gera impactos para terceiros que não estão precificados).
Figura 4- Dependência e impacto
No mercado financeiro, as necessidades e exigências do cliente também estimulam um comportamento das empresas alinhado a fatores ESG. De acordo com o Bank of America, os millenials/geração Y domiciliados nos EUA poderão investir US$15 bilhões em ESG nas próximas duas décadas. Além disso, a maior gestora de ativos do mundo, a BlackRock, sinaliza que o investimento sustentável é essencial e irá crescer. Em carta aos CEOs das empresas investidas, Larry Fink (CEO da Blackrock) destacou que de janeiro a novembro de 2020, os investidores em fundos mútuos e ETFs investiram US$ 288 bilhões globalmente em ativos sustentáveis, um aumento de 96% em relação ao ano todo de 2019. Por fim, o PRI (principal iniciativa mundial que congrega investidores responsáveis) demonstra o crescimento de seus signatários, com aumento de 20% em 2020.
Razões para integrar ESG
Nessa discussão, podemos perceber alguns dos aspectos relevantes para integração ESG na tomada de decisão e que contemplam:
- Ética;
- Megatendências;
- Desempenho financeiro;
- Dever fiduciário;
- Regulamentação;
- Economia;
- Impacto;
- Demandas do cliente e
- Materialidade financeira. Esses aspectos são mais bem explorados no nosso curso.
Principais stakeholders ESG
Cabe destacarmos também os principais stakeholders do ESG:
- Proprietários de ativo que normalmente buscam curto prazo, levando as empresas a também não investirem em projetos de longo prazo mais voltados a fatores ESG
- Gestores de Ativos
- Cadeia de valor da empresa, podendo contribuir na mitigação dos riscos e na geração de impacto positivo da empresa na sociedade e ambiente
- Legisladores e reguladores, reconhecendo cada vez mais o impacto dos fatores ESG para a estabilidade do sistema financeiro e na carteira do investidor
- Governo, reconhecendo cada vez mais a relevância dos fatores ESG
- Empresas investidas
- Sociedade civil e acadêmica, pressionando cada vez mais para a integração de fatores ESG.
Tendências
Para o futuro da temática, vemos a crescente solicitação dos órgãos reguladores, investidores e gestores de ativos por transparência, padronização e comunicação em torno dos fatores ESG. Além disso, nesse período de pandemia foi possível observar os fundos de ações sustentáveis superando seus pares tradicionais (Morningstar, 2021). Ademais, percebeu-se um maior enfoque das empresas nos fatores ESG, mostrando-se mais preparadas para lidar com mudanças e aumentando sua atratividade frente aos investidores.
A governança (o eixo G do ESG) cresce em relevância, sustenta e impulsiona as ações com transparência, padronização e comunicação, indo muito além do cumprimento de requisitos regulatórios e gerenciamento de riscos. A adoção das melhores práticas de ESG gera benefícios tangíveis e intangíveis aos negócios e viabiliza a atração de investidores.
Esses assuntos são abordados de forma mais detalhada no curso Fundamentos de ESG corporativo, especificamente em seu primeiro capítulo, denominado “Introdução à ESG e o valor agregado à empresa”. O capítulo cobre os seguintes tópicos:
- Definindo ESG e conceitos correlatos;
- Por que ESG é importante hoje?;
- ESG no tempo;
- Drivers, benefícios e desafios do ESG;
- ESG e os ODS nas empresas
- Stakeholders do ESG e futuras expectativas.
E em breve traremos enfoques específicos sobre os outros capítulos! Aguarde!